O Valor Humano da Palavra

Venha bater aquele papo furado. Área típica para flood.
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RurouniAndre
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O Valor Humano da Palavra

Mensagem por RurouniAndre »

Autora: Fernanda Queiroz

A grande contradição da língua nativa, no nosso caso, o português, é ser espelhada pelo "ja sei tudo o que preciso" e "não sei nada disso, é difícil demais". É a polarização entre a língua da minha vida e a língua da escola que foi construída pelas escolas, instituindo um muro entre o conhecimento do aluno e o conhecimento formal. Como não se estabelece um fluxo entre as duas, estabelece-se um ensino que trata a língua materna como língua estrangeira, revogando toda a complexidade da vivência humana pela linguagem.

Nenhum ser humano é dono da totalidade de uma língua, mas é dono da experiência subjetiva com ela. Significa que ninguém poderá se colocar como autoridade irrefutável no conhecimento de todas as possibilidades da língua, dado que são infinitas, mas é capaz de se apropriar da totalidade das experiências com elas, porque são finitas como o é o ser humano. Todavia, há aqueles que exploram a linguagem de propósito, crescem juntamente com o maior conhecimento que vão produzindo a seu respeito, Há aqueles que buscam aprimorar as experiências intelectuais, subjetivas mediante a desenvoltura no manejo com o português. Vão estudando, ouvindo, observando, lendo, experimentando, criando, assumindo uma postura mais reflexiva e menos reativa.

Esses conseguem mais distâncias no espaço infinito da expressão. Imagine a criança ao descobrir que seu choro gera uma reação ao seu redor, que um conjunto de sons ordenados fazem aquela mulher sorrir. Ela reage experimentando, dando suas primeiras interferências do seu existir no mundo. Ela cresce, entende o xingamento, o tabu, o elogio, o pedido, a ordem, a súplica, a ofensa.

Vai à escola e lhe dizem que tudo o que ela diz e, portanto, tudo o que ela é, já que dizer algo é dizer-se sempre, e aí emudece perante um sistema ideológico dividido entre mandar e obedecer. Então, as experiências, que não param de chegar, vão se acumulando em um engarrafamento de coisas não-ditas que irão explodir em outros flancos, seja na raiva, na fala sem propósito, no pensamento rancoroso ou deprimido. A escola deveria desafogar esse tráfego para que a movimentação do dizer seja cada vez maior. Mas coloca um sinaleiro sempre em vermelho.

Há tantas roupas para se vestir, há tantas variedades à nossa disposição, porque a variedade do documento burocrático é colocada hierarquicamente superior à variedade de nossos amores e memórias? A escola bem que tem que ofertar o terno, o paletó, a roupa de gala, mas não ao ponto da roupa de trabalhar confundir-se com a pele de quem tenta não só caber como usar essa vestimenta. É preciso estudar, ler, ouvir, interagir, construir? Sempre. O mundo construído pela linguagem é maior que o mundo não narrado, o mundo das coisas.

Ele está lá, pulsando, mas há códigos a serem conhecidos, explorados, códigos que não se aprende pelo contato simplesmente. Há que se ter o mediador, o que entende desses códigos para que a chave seja girada. Pode ser o professor, o líder religioso, o pai, a irmã mais velha. Há regras para serem conhecidas e só assim serem quebradas. O português "já-sei" tem que se misturar com o português "nunca-vou-saber". Juntos, trabalharem para o ser humano, que lhes dá existência, também possa existir.

A linguagem, abstrata, expande a intelecção das experiências concretas. A linguagem, mesmo não se entregando inteira a ninguém, é o único caminho para se alcançar a inteireza de ser.

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CineBraManiaco
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Texto Pessoal: Vamos Nessa!

Re: O Valor Humano da Palavra

Mensagem por CineBraManiaco »

Prezado RurouniAndre: o teor do texto reproduzido por você - com o qual concordo, deixa um amargo sabor de decepção, mais do que a esperança, da vontade de novos tempos. Isto quando se vê filhos e pais em completo divórcio de corações e mentes; um sistema de ensino no qual vicejam as aprovações automáticas; professores mal preparados, mal remunerados e desrespeitados - causas e consequências ao mesmo tempo; onde passar no vestibular é um objetivo - que não se perca pelo nome - e não uma consequência do processo de aprendizado, e os cursos universitários padecem da ausência e/ou insuficiência de qualificação dos mestres, doutores e livres-docentes. Como dizia o poeta, o buraco é mais profundo do que parece. A isto se junta um mundo da cultura da velocidade máxima, onde o ontem já é sucata, e o amanhã já está com cara de ontem; onde a qualidade das relações humanas é medida pela quantidade de "amigos" que "curtiram" as postagens nas redes sociais - e alguém nos idos 70' cantava "eu quero ter um milhão de amigos"; onde os meios-de-comunicação passaram a ser fins-de-comunicação - no início, celular à mesa era falta-de-educação. Hoje não tê-lo, faz do leniente esquecido uma "figura-de-outro-mundo" e onde os escritos internéticos são capazes de lançar aleivosias e transformá-las em verdades incontestáveis. Neste caldo de (in)cultura parece ser utópico tratar da "inteireza" do ser. Se eu tenho sugestão? Nenhuma. Além de no ofício diário de continuar vivenciando junto àqueles que me são próximos, as convicções sobre a educação nas relações humanas, o respeito e o trato digno do semelhante, por mais diferente que ele a nós pareça. Se possível, em linguagem que encurte a distância entre o "já-sei" e o "nunca vou saber". Mas, confesso, estou perdendo as esperanças. A quem teve paciência de vir até aqui, peço escusas pelo longo desabafo.

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fromking
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Texto Pessoal: warezmaníaco

Re: O Valor Humano da Palavra

Mensagem por fromking »

A equipe hoje está se mostrando altamente filosófica.
Tanto o Rurouni, na escolha do texto, quanto o cinebra,
em sua contra argumentação, estão cheios de razão.
O mundo moderno, realmente, conduz o ser humano a
caminhos que o afastam cada vez mais do convívio
salutar que se obtém através da palavra, da conversa,
da transmissão da experiência de vida.
É lamentável.
8-)
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RurouniAndre
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Re: O Valor Humano da Palavra

Mensagem por RurouniAndre »

A autora é 8 ou 80, sem meios termos, pelo pouco que a conheço, qndo escreve txts mais ácidos na verdade é um desabafo.

Vou procurar nos arquivos um que ela escreveu uns dois/três anos atrás que fez sucesso em outro fórum.

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