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De vampiros portenhos e sonhos escabrosos - 12º conto:

Enviado: Seg Dez 22, 2014 12:16
por Lady Carmilla DWFan
Contos anteriores:
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Velho conhecido nosso aparecendo de novo... (Duas primeiras partes da "Trilogia dos Espantos": viewtopic.php?f=53&t=10081" onclick="window.open(this.href);return false; e viewtopic.php?f=53&t=10391" onclick="window.open(this.href);return false;. Estou fazendo um "reboot" das histórias, mas as outras estreladas por ele não sofrerão alterações.)


A donzela e o vampiro (Quinceañera)


A única luz da casa vinha do quarto. O único som, do mesmo lugar. As quinze primaveras da dona do recinto estavam próximos e ela não muito feliz. Não era nem pela festa, onde muitos que ela não conhecia e outros poucos com quem ela tinha amizade iriam dar-lhe os parabéns pela chegada à adolescência. Menos ainda era pelo vestido branco enorme que obrigatoriamente usaria para ser introduzida à alta sociedade portenha ou os sapatos igualmente brancos causando dor nos pés após horas de uso.
Era pela ausência dele. Seu cantor favorito não estaria lá para dançar com ela a “Valsa dos Quinze Anos”, pois havia ido em viagem sem retorno perto de completar um ano. Lembrava-se de quando a mãe havia lhe prometido trazê-lo para cantar na festa e pedir que concedesse a jovem a honra de uma dança. Um sonho agora mais distante que as tão garbosas e exibidas estrelas no céu. Seus devaneios foram interrompidos quando uma parte de uma de suas músicas preferidas parecia coincidir com o silvo do vento...
“... que Moscú está cubierto de nieve/ y los lobos aúllan de hambre/ No cantes que Olga no vuelve,/ aunque el sol nuevemente ilumine,/ aunque siga cayendo la nieve...”
Foi quando Matilde Olmos y Piñedo percebeu que o frio da noite já estava deixando seu dormitório gelado, razão pela qual se levantou para fechar a porta da sacada. Foi quando viu no jardim, próximo às roseiras, o que parecia ser um vulto negro acariciando as flores. A menina rapidamente trancou a janela e fechou as cortinas, assustada com tal visão. Desligou o 78 rotações e deitou-se na cama ainda temerosa com o visto. Cobriu-se até a cabeça desejando esquecer coisa tão assustadora.
O vulto negro sabia onde estava e o que queria. O desejado, porém, não era o que muitos certamente pensariam. Queria realizar o sonho da jovem aos quinze anos chegando. Sabia de quem Matilde era filha.
Recordava com carinho a época de apenas quatro meses que havia namorado a jovem Margarita Duran. O relacionamento havia acabado em razão de que os sonhos e anseios de ambos não combinavam. Sua ex-namorada havia se casado com um fazendeiro, Rogelio Olmos y Piñedo e do casamento nasceu Matilde, a única filha do casal. “Marga”, como o vulto carinhosamente a chamava quando juntos estavam, enviuvou sete anos depois, quando o marido faleceu vitimado da mesma coisa que ele tinha: problemas hepáticos transformados em pancreatite.
Confessou que se impressionava sobre como Margarita se mantinha linda a despeito de seus 37 anos completos. Perguntou-se qual seria a reação dela quando visse a rosa vermelha que ele havia deixado na cômoda ao lado de sua cama. Apenas sorriu, deixando aquele belo jardim logo em seguida, permitindo que o vento levasse um pouco sua capa, vestimenta da qual ele muito gostava por lembrar os ponchos que ele usava no frio quando ainda era humano.
...
Pelo menos duas semanas se passaram.
Margarita Duran continuava sem entender quem havia colocado aquela flor, que ainda se conservava bela e fresca, perto de sua cama. Não podia ser ele, pois há um ano havia falecido e mesmo quando Agustín estava vivo, ela não o via pessoalmente desde ter se casado. E até dois anos atrás, morava no Uruguai com a filha após ficar precocemente viúva e ter de administrar uma enorme fortuna em fazendas, gado e indústrias deixadas pelo marido.
No entanto, aquela rosa a fazia lembrar-se dos quatro lindos meses com ele, incluindo as rosas sempre deixadas em sua porta. Um tempo que não mais voltava e ainda a marcava, mesmo passados dezesseis anos. Suspirou desejando poder realizar o sonho de sua pequena Matilde. Resignou-se, no entanto, a chamar o senhor Pedro Noda, companheiro musical de uma década de Agustín Magaldi. E também a senhora Azucena Maizani, de quem o marido era admirador a despeito de suas maneiras um tanto conservadoras com relação a certas coisas.
O dia seguinte marcaria os quinze anos de Matilde e o primeiro aniversário de morte de Agustín Magaldi ainda que os fatos em si fossem tão diferentes.
...
Era estranho imaginar-se completando um ano, ainda mais quando a situação não envolvia fraldas, chupetas, chocalhos, babadores, brinquedos ou uma mãe feliz embalando seu pacotinho fofo no colo. Naquela noite, alguns presentes encontravam-se sobre a mesa da antessala de onde ele atualmente morava com sua mestra Rufina, no momento fora.
Don Rodolfo Soler enviara um refinado relógio de ouro de feitura francesa. Teresa, usando com sua patroa a desculpa de que um querido amigo fazia aniversário, mandou-lhe um elegante terno negro de corte perfeito. Elijah e Margot, em conjunto, haviam lhe enviado mais um livro sobre vampiros e outras criaturas sobrenaturais, pois fauna de tais seres era o que não faltava e ele sempre necessitava de mais e mais informações. Rebeca, apesar de tudo, lhe mandara, por intermédio da amiga modista, um belo buquê de rosas brancas, indicando que a paz selada entre eles agora era definitiva.
Aquele último presente lhe trouxera algumas lembranças dos últimos seis meses que vieram após falecimento de Doña Jazmin: Rebeca havia se mudado do antigo cortiço em que morava para morar na antiga casa de Teresa, agora oficialmente casada com Rodolfo Soler. Continuava trabalhando com Loyola, insistente em não contar-lhe as razões de sua desaparição de uma semana, limitando-se a dizer sobre motivos que ela não compreenderia.
No meio disso, Magaldi pensou seriamente em iniciar a corte à florista, mas ele logo percebeu: dificilmente ela cederia de imediato aos encantos de um vampiro depois de ter visto o que vira. Limitou-se a visitá-la de vez em quando, procurando ser o mais cuidadoso possível na aproximação. Restringindo-se a deixar algum bilhete carinhoso junto de uma flor ou perguntar como ela passava. Detalhes que ela aceitava até bem, mas com muitas reservas, pois claramente ela o temia.
E Rebeca realmente temia, mas em ceder aos sentimentos que insistiam em aconselhá-la a trilhar um caminho perigoso. A jovem rezava todos os dias pedindo, por favor, para ser capaz de esquecer seu amor por ele. Ainda mais porque ela não sabia a razão desse amor ter nascido e especialmente, florescido em seu coração.
Era como se o destino brincasse com ela. Não raramente sonhava com estranhas paisagens. Nelas, era uma jovem e apaixonada rainha que em nome de ajudar seu amor, um belo guerreiro de longos cabelos brancos, sucumbiu junto a seu amado ao combater um grande mal que planejava semear o caos sobre a terra. A florista acordava aos prantos e gritos sem compreender o significado daquilo.
...
A tarde do dia oito de outubro era particularmente bela apesar de estar muito frio, como era o costume do inverno argentino embora a primavera estivesse a duas semanas de começar. Toda a Argentina cantava e celebrava tristemente o primeiro “cumpleãnos mortuario” de “La Voz Sentimental de Buenos Aires”. Ao mesmo tempo em que a “quinceañera” de Matilde Olmos y Piñedo ocorreria na casa da cobiçada viúva Margarita Duran, há dois anos retornada à Argentina. E desde então atraindo um inesperado séquito de seguidores masculinos.
No entanto, “Marga” não se interessava em ter um segundo matrimônio porque estava preocupada em dar um bom futuro à Matilde. E pensar no seu próprio, já que adquirira, com o falecimento precoce do marido, uma independência nunca antes imaginada e uma, até então improvável, grande liberdade de tomar decisões por conta própria. Duas coisas que ela não queria perder jamais, pois ainda eram raras as mulheres que podiam ter esse luxo.
Um luxo também era a festa que tão belamente organizada estava e aos poucos ficava cheia com os convidados escolhidos para a celebração, incluídos Don Rodolfo Soler e sua esposa Teresa Rosas, o professor Elijah Colman e sua fiel escudeira Margot, e Rebeca Tsekub. Ela, nos últimos meses, se destacara, com ajuda de “Doña Soler”, como uma excelente paisagista, sendo muito solicitada para criar os mais belos jardins para os mais ricos. E dois muito pontuais “tangueros”: o senhor Noda e a senhora Maizani, amavelmente aceitando o convite de Margarita para cantar na festa da bela senhorita de quinze anos.
E novamente Colman havia mostrado seu talento como “tanguero” cantando “Disfrazado” em homenagem ao morto naquele dia celebrado. A jovem Matilde, por sua vez, encontrava-se muito feliz apesar da data coincidir com um ano de tristeza por Agustín Magaldi, inclusive tinha aceitado dançar uma valsa com Pedro Noda.
Aquela felicidade durou toda a tarde e pelo menos uma hora e meia noite adentro, tendo sido um total sucesso. Especialmente pela inesquecível apresentação em dueto de Pedro e Azucena muito aplaudida pelos convidados e aniversariante, que antes do término da festa, insistiu à mãe para que os convidasse à janta daquela noite. Convite que os dois aceitaram após conversarem com a anfitriã.
O jantar, ao seu turno, havia sido muito agradável e enfeitado com um delicioso vinho portenho que Matilde não podia beber porque a idade não lhe permitia ao que ela se restringiu ao suco de laranja, delicioso. A menina de quinze anos agora completos encontrava-se muito satisfeita com aquele dia, do qual jamais esqueceria. No entanto, o verdadeiro motivo da relembrança seria muito diferente do esperado.
A jovenzinha ainda se encontrava com seu vestido de quinze anos, os sapatos de refinada fivela e sua tiara de brilhantes ao ir à biblioteca pegar um livro sobre tango para mostrar aos convidados que haviam jantado em sua casa. Quando se deparou com uma figura de negro parada na porta que levava ao jardim: - Buenas noches, joven Matilde.
Ela não podia acreditar no que via: - Como você pode estar aqui se está morto?
- O seu pensamento me deu uma chance de vir até aqui realizar seu desejo de aniversário. Você me queria para uma dança, cá estou – disse ele sorrindo cordial enquanto o vento parecia dar-lhe um ar sinistro em razão do ar em movimento balançar o longo manto.
A menina, apesar de ver seu sonho a ponto de tornar-se realidade, não podia evitar achar estranho o fato de que o fantasma se vestia parecendo que ia pegar chuva, considerando a capa que usava, embora ela não tivesse um capuz. Ela não podia negar, porém: a fatiota debaixo lhe caía muito bem.
- Fantasmas atravessam qualquer corpo sólido, não? – perguntou ela se aproximando cuidadosamente.
- O seu desejo de aniversário faz com que eu seja tão sólido quanto estes móveis, podendo assim dançar com você. Então, me permite realizá-lo? – ele aproximou-se com incomum rapidez, oferecendo a ela sua mão enluvada pela mais fina pelica.
Matilde aceitou acompanhá-lo à grande sala, que estava totalmente vazia, já que sua mãe se encontrava conversando com Azucena Maizani e Pedro Noda na outra parte dedicada às visitas. A aparelhagem 78 rotações se encontrava desligada. Magaldi, que agora se encontrava com a fã, pediu à menina que escolhesse uma valsa bem bonita para eles dançarem.
A debutante logo escolheu a música: uma valsa de Strauss chamada “Sangre Vienense”, logo ecoando pela sala, fazendo dois pares de pés entrarem em estranha harmonia aumentando a cada passo e a cada giro, cuja química era dotada de uma aura tão sobrenatural que era capaz de prender até o mais cético dos olhares. Olhares esses que pertenciam a Margarita e aos tangueros, que estranharam o som repentino vindo da sala e se viram fixos à apresentação mais incrível já vista.
A habilidade do vampiro Agustín era hipnotizante a despeito da mudança de ritmo da música, ali parecendo enlouquecer e a menina Matilde parecia quase flutuar nos braços da criatura quando a parte final da música coincidiu com um grito apavorado de Azucena, que desmaiou com o terrível susto. Enquanto Noda e Margarita se agarravam fortemente à porta do recinto...
- Santo... Deus... amado – o antigo parceiro se via incapaz de reconhecer o amigo e companheiro musical vestido daquela maneira tão espalhafatosamente estranha.
- Como...? – a viúva de Olmos y Piñedo sentia seu sistema nervoso falhar.
Ele sorriu amavelmente aos dois que tão espantados o olhavam para depois beijar as mãozinhas delicadamente enluvadas da fã: - Permitame ir ahora. Hay llegado mi hora, Matilde.
- Foi uma honra tê-lo como meu par esta noite – respondeu sorrindo a jovem enquanto ele se afastava.
- A honra também foi minha, adorável – disse ele para em seguida estalar os dedos, gesto que abriu a porta da frente, por onde ele garbosamente saiu, deixando incrédulos e assustados os dois humanos. Eles logo trataram de acudir a desmaiada cantora enquanto Margarita pedia à filha que agora mesmo subisse ao quarto e trancasse tudo.
Nenhum dos quatro jamais esqueceria aquela noite enquanto vivessem. E para um vampiro, uma noite é apenas mais uma noite, mas para Agustín Magaldi aquela não era só uma delas. Tinha sido especial. E sempre seria. Enquanto ele vivesse.



Só observem o traje que eu imaginei ele usando: http://www.doctormacro.com/Images/Lugos ... %29_01.jpg" onclick="window.open(this.href);return false; 9 (Incluam a capa, :lol: .)


Espero que tenham apreciado, :D . Comentem, opinem, sugiram. O tópico é para isso mesmo!

Re: De vampiros portenhos e sonhos escabrosos - 12º conto:

Enviado: Seg Dez 22, 2014 08:08
por Lady Carmilla DWFan
Edição feita por razão de ter esquecido o conto anterior na lista de anteriormente postados.