, cheguei no trinta! YAHOO! Espero que gostem! E claro, espero comentários, .
Ela se preparava para receber mais um cliente. Aquele devia ser o... Já nem contava mais. Apenas anotava o nome no diário após passar algum tempo com o homem que a pagava. Geralmente boas notas de dinheiro. Algumas vezes, cheques. Outras, uma joia que equivalia a um mês de trabalho.
Por sorte, a patroa era mulher generosa. Não cobrava mais que 15% do lucro das meninas durante o período. Se perguntava quais seriam as outras coisas que Dona Teresa fazia para manter a casa funcionando. Afinal, era caro manter uma casa de três andares onde moravam pelo menos, naquele momento, trinta mulheres cujos gastos muitas vezes ultrapassavam o normal. Do total, pelo menos três eram novatas. Naqueles oito anos de casa, vira muitas irem embora para outros empregos ditos “mais honestos”, outras se casando com pretendentes que as levavam para outros lugares. Duas haviam morrido tísicas em um período de pelo menos dois anos. Nem mesmo os poderosos remédios da patroa haviam ajudado.
Tísicas mesmo? Ela se questionava ao lembrar a agonia das moças do terceiro andar ao ver as colegas naquele estado. Não compreendia. Afinal, se não havia mais solução, então qual a razão de ficarem apavoradas daquele modo? Era como se elas vissem algo que outros olhos não viam. Sarah tinha uma probabilidade: o último piso tinha um segredo muito sombrio. A única explicação possível, pensava ela. As moças do andar sempre com lenços amarrados ao pescoço. Ganhavam uma soma bem superior às das moças do segundo andar e do térreo. Andavam com uma gente muito esquisita quase sempre. Homens, e por incrível que pareça, também mulheres, vestidos de preto da cabeça aos pés.
Brancos e negros. Loiros, morenos, ruivos. Todos algo pálidos. Para sua própria infelicidade, a cortesã conhecia um bocado as lendas de seus antepassados leste-europeus. Era filha de imigrantes. Nascera em Esquel, no ano de 1907. Embora a chamassem somente de Sarah, fora batizada como Mariska Sarah Elisabeta, uma homenagem às irmãs da mãe, mortas ainda infantes. Crescera incrivelmente rápido. Sua beleza abrira-se como um botão de rosa no auge primaveril. Logo atraiu incontáveis olhares de inúmeros homens, mesmo tendo apenas 16 anos. Os pais, desejando para a filha futuro melhor, enviaram-na para a capital. Pensavam: ela podia ser dama de companhia de alguma ricaça. Como eram ingênuos, ela pensou.
Chegando à capital, logo se empregara como camareira de hotel. E muitas vezes fazia as funções de arrumadeira e faxineira, pois o hotel carecia de gente embora fosse cinco estrelas. Sarah, porém, não demorou a perceber que sua beleza abriria portas se soubesse empregá-la direito. Depositou a soma dada pela mãe em uma conta bancária que abrira logo de começar a juntar algo de seu pouquíssimo salário.
Por fim, acabou entregando-se ao primeiro de muitos homens com quem dormiria antes de Teresa fazer-lhe a proposta de se juntar as meninas do Media Luna. Como se dizia entre os brasileiros, tornara-se “teúda e manteúda” de vários cavalheiros ricos, que lhe davam caríssimos presentes em troca de momentos de luxúria e prazer com ela. O dono do hotel sempre soubera. Tinha a certeza de que ela acabaria indo por aquele caminho. Era linda demais para ficar só de empregadinha.
Fez acordo silencioso com ela: ele a permitia usar os quartos do último andar com seus clientes desde que atraísse mais hóspedes. A jovem aceitou. Até mesmo permaneceu como camareira. Queria evitar que soubessem de sua ocupação verdadeira, pois ela sabia muito bem que não a veriam com bons olhos em razão disso. Permaneceu por bom tempo mantendo vida dupla, quando os funcionários começaram a desconfiar que alguma coisa estava errada. O movimento do hotel era absurdamente alto até mesmo para um local como aquele. Muitas vezes o número de hóspedes ultrapassava a capacidade e reservas tinham de ser feitas.
Sarah logo percebeu que as coisas começariam a dar errado e achou melhor pedir demissão. O proprietário bem que tentou argumentar, mas a situação não era nada favorável para os dois. Se os funcionários soubessem, poderiam fazer qualquer coisa louca. Incluindo alertar a concorrência. Afinal, não era comum, e até mesmo era pouco ético, usar uma prostituta de luxo disfarçada de camareira para atrair clientela. Acabou que ela foi embora definitivamente do hotel. Morando em um quarto de pensão alugado por poucos pesos, ela lá guardava os presentes caros que ganhava. Era hábil na arte de ocultar-se. Alguém, porém, era ainda mais na arte de descobrir.
Foi quando Teresa bateu-lhe a porta. Era o ano de 1927. Sarah fizera vinte anos dias antes da visita. Morava em um apartamento que comprara com suas agora muitas economias advindas daqueles quatro anos de prostituta. Possuía um closet lotado de elegantes vestidos, meias, lingeries e tudo o mais que uma mulher como ela necessitava. Um baú cheio de joias mostrava o quão bem se dera na vida. Precisava, porém, disfarçar isso para os pais quando ia visitá-los. Inventara a história de que havia conseguido casamento com um jovem de classe média. Ele, porém, morrera cedo, deixando-lhe bom dinheiro. E ficou com mais ainda ao usar os conhecimentos aprendidos do marido. O casal impressionou-se com tal coisa, inclusive com o fato de que ela ainda usava a aliança de casada. Forjada para dar maior veracidade à mentira.
Teresa Maldonado propôs que ela fosse parte do elenco do Media Luna. Ficaria com pelo menos 85% do lucro obtido no mês todo e teria total liberdade para ir e vir. E a cafetina garantia: clientes mal intencionados jamais ousariam tentar pagá-la com joias falsas. Sarah não acreditou quando a mulher citou aquilo. Lembrava-se de que só não tinha sofrido coisa pior porque um vizinho dera um bom soco na cara do desgraçado a tentar enganá-la. O mesmo dissera-lhe que o bordel de Dona Teresa era o local ideal para ela. Ser independente não era de todo ruim, mas a segurança vinha em primeiro lugar.
Receou-se da proposta, mas logo pensou melhor nela. Acabou aceitando. Deixou o apartamento aos cuidados do fiel vizinho e amigo e levou seus pertences ao bordel, onde foi instalada em um quarto não muito grande, mas muito bom. Desde então, era procurada não só por seus clientes habituais da fase anterior, mas por incontáveis outros desconhecidos. Inclusos garotos virgens que mal sabiam onde tocar uma mulher. E alguns velhos pervertidos bêbados que desejavam recordar a juventude. Naquele minuto, porém, um novo cliente aparecera sem dar aviso. Na verdade ele era um velho conhecido. Dez anos haviam se ido desde tê-lo visto pela primeira vez. Só que... ele morrera meio ano depois da noite deles.
- É você mesmo? – a escova com a qual ela arrumava-se ficara presa nas pontas do cabelo em razão do susto.
Loiro, bem vestido e sempre acompanhado de uma bengala, além de luvas brancas. Os gestos antes nervosos deram lugar a movimentos lânguidos como os de um felino caminhando em um muro. Sarah mal conseguia piscar diante daquela visão. Temia que ele fosse um fantasma. Ao mesmo tempo, sabia que ele não era. Algo naquela figura a fazia enxergar uma estranha realidade: as lendas tinham lá o seu fundo de verdade. No entanto, a coisa real era muito mais assustadora. E ademais, fascinante: - Por favor, fale comigo. Não sei se você é um fantasma do meu passado ou...
Um delicado gesto com o indicador diante dos lábios a interrompeu: - Quero que seja como há dez anos. Aquela noite nunca saiu da minha mente, Sarah. Você me daria isso de novo? Nem que seja apenas uma vez?
- Samuel... – ela tentou dizer uma frase completa, mas a língua não conseguia mais soltar-se. Ela só podia desejar uma coisa por razões que desconhecia: saber como a lenda funcionava na vida real.
Aquele Samuel, de “apellido” Linnig, outrora escrevera peças teatrais e letras de tango. Agora, seu trabalho era encontrar artefatos raros e vendê-los a bom preço para colecionadores ricos e/ou estudiosos de coisas antigas. E, algumas vezes, executava serviços sujos, como roubo de coisas valiosas para retorná-las a seus locais de origem e assassinato por encomenda. Às vezes, os defuntos saíam mais baratos e lhe proporcionavam excelente jantar. Descontando, é claro, as vezes em que ele era obrigado a dormir nos locais mais insólitos durante o dia.
Sarah viu quando ele aproximou-se. Os passos quase não fizeram ruído. Eram de uma delicadeza ímpar. Os olhos dele de repente tornaram-se chamas. Naquele momento, a cortesã nada sabia do futuro.
Só sabia que nada seria a mesma coisa. E a vida quem sabe teria um sabor mais doce. Um pouco mais rubro, quem sabe.
Persongem histórico: http://www.todotango.com/creadores/fich ... uel-Linnig" onclick="window.open(this.href);return false;
De vampiros portenhos e sonhos escabrosos: 30º conto
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Re: De vampiros portenhos e sonhos escabrosos: 30º conto
P variar, excelente!
Qndo vai sair a compilação em pdf?!
Qndo vai sair a compilação em pdf?!
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Re: De vampiros portenhos e sonhos escabrosos: 30º conto
MUITO obrigada, moço!
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Re: De vampiros portenhos e sonhos escabrosos: 30º conto
Prezada Lady, Parabéns pela marca de 30 contos De vampiros portenhos e sonhos escabrosos. Uma verdadeira saga literária com ambientação e temática muito próximas de nós leitores. Seu estilo , eu já afirmei antes, é um mergulho no universo vampírico com direito a descrições bem próximas de um roteiro de filme. Com certeza vou apreciar também "As meninas de Dona Teresa" .
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Re: De vampiros portenhos e sonhos escabrosos: 30º conto
Que venha o dobro de trinta, . MUITO feliz pelas tuas considerações!
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Re: De vampiros portenhos e sonhos escabrosos: 30º conto
E tu sempre vens com excelentes imagens, . Adoro!